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quinta-feira, 20 de março de 2008

Os Filhos Deste Solo

Um fato interessante que rememorei esses dias, foi de uma festa do dia 02 de fevereiro de um ano qualquer de minhas lembranças. A igreja cheia, os sinos repicando, as mulheres descalças, os homens tirando os chapéus diante do andor enfeitado de flores, onde em cima encontrava-se a imagem barroca majestosa da madrinha de São Vicente Férrer: Nossa Senhora do Rosário.

Naquele dia, a senhora do céu para os homens e mulheres da fé católica desfilaria pelas ruas estreitas da fé católica desfilaria pelas ruas estreitas da cidazinha, ouvindo os benditos, o som alegre da banda tocando os antigos dobrados do Mestre Patrício, acolhendo as preces e os anseios de amor dos que esperavam o baile da noite.

No adro da igreja formavam-se as filas das irmandades e erguiam-se os estandartes sob as ordens do padre, enquanto os devotos da santa tiravam fotos estáticas diante do andor.

De repente, entra na igreja Dona Mariana Borges com seu porte ereto e firme, vestida de branco completo, cortado apenas pelo vermelho da fita do Coração de Jesus e com um sempre sorriso aberto! Parou na nave da igreja, ajoelhou-se e fez uma prece breve diante do andor e ficou a conversar com os que a interpelavam, com a atenção e alegria de sempre ia dialogando com os conhecidos.

De repente entra uma senhora da Zona Rural com véu na cabeça e trazia nas mãos grossas um maço de folhas medicinais e depois de uma oração silenciosa entre os lábios, passou o maço de folhas acariciando a imagem da santa como se aquele gesto estivesse sendo realizado com a própria entidade celeste e estivesse dando àquelas folhas um poder de cura maior.

Esta senhora logo depois de seu gesto foi interpelada por uma pessoa da igreja “que lhe falou que aquela imagem era apenas uma imagem e não a santa em si, era apenas um retrato para lembrar um ser importante.

Diante daquele fato, Dona Marina interagiu e disse à senhora desapontada: - Tem nada errado não irmã, a fé tem poder!

Sensibilidade, Fé e Poesia: O Mar de Marina Borges


Marina Borges de Farias, nasceu em São Vicente Férrer em 18 de fevereiro de 1936. filha de José Galdino Borges e Maria José da Conceição Borges (Dona Liquinha). Viveu sua infância no Brejo de São Vicente que naqueles tempos vivia o auge do café. Era uma criança alegre e participativa dos eventos que cabiam a infância daqueles tempos. Participava dos eventos infantis de pastoril, danças de crianças, e dos acontecimentos religiosos todos, tendo em vista que a grande fé de Dona Liquinha sua mãe que além de filha de Maria era cordão de São Francisco de Assis, o que a fez usar marrom até a morte.

Viveu uma infância livre nos limites do recanto, entre os serviços da casa, as brincadeiras e o tilintar dos libros da almofada de fazer renda de Dona Liquinha.

Como quase todas as crianças cursou o antigo primário e a descoberta das letras lhe demonstrou o poder que um lápis dá a imaginação, quando transformou o mundo imaginário de um vivente em letras.

Os recitais de poesia da escola, as composições rimadas das ladainhas da igreja, o arrumado dos versos de improviso dos violeiros e emboladores de coco das feiras, serviram para mostrar à menina Marina que as palavras são plásticas e que moldadas e arrumadas produzem o som agradável e criativo dos versos.

Vivia a escrever, a criar, a brincar com as palavras e na juventude, o amor ampliou as assas do verso. Como fica claro nesta produção sua de 28-04-1965:

“Hoje está completando

Seis meses do nosso amor

No dia seis de março

Me ofertaste uma flor

E neste dia em diante

Nosso romance começou

Foi na festa do Cruzeiro

Quando uma flor tu tiraste

Do andor da Virgem Maria

E a minha mãe entregaste

Também no meu coração

Neste momento roubaste...

Daí a quarenta dias

Nosso sonho se realizou

Em uma tarde de Abril

Consagramos nosso amor

E nossa santa união

Um padre abençou....

Até, meu querido esposo

Minha vida, meu amor

Eu ofereço estes versos

Tal qual aquela flor

Para que dia a dia

Multiplique o nosso amor!”

Em meio ao casamento, as obrigações cristãs, as muitas amizades que fez, Marina trabalhou como funcionaria da Prefeitura Municipal compondo os primeiros quadros de funcionários municipais.

Era muito dedicada ao trabalho, extremamente querida pelos companheiros de serviço e muito antenada aos acontecimentos de sua época.

Seu conjunto de poesias e parodias que deixou, deixam claro seu interesse pela política e pelos acontecimentos do Brasil e do mundo. Existem muitos escritos dedicados a temas de fé e devoção, aos amigos queridos e também deboches políticos, engraçadíssimos como no seu “O padre político”.

“Padre Machado quando vai confessar

Até a penitência

Se esquece de dar

Não dá absorvição

Diz: Peça a Nosso Senhor

Para Benigno Moura ganhar

A Santa Missa celebra pela metade

Deixa os fiés sem a benção

Corre logo pra cidade

Chamar de um em um

Para sentar ao seu lado

Se fazendo de amigo e de delicado

E diz a todos: eu sou um padre justo e digno

Por isso peço a você

que dê um voto a Benigno”.

Nesse verso fica claro que seu poder de crítica e senso se justiça não eram misturados à valores de fé e submissão. Entre esse texto existem muitos outros ligados a vida política, outro interessante é: “Política? Não.” Um dos seus últimos escritos.

“Está se aproximando o tempo

Que só se ouve falação

Um diz que é honesto

E que o outro é ladrão

Isso é o que mais se escuta em época de eleição.

Tem político que promete

Roubando a consciência do povo

Ele mesmo sai mangando

Enganou o bobo na casca do ovo

E o besta todo feliz

Por que andou de carro novo.

Tem pobre que briga com amigo

Esse é um coitado

Depois da eleição

Qual é o resultado?

Os políticos se dão as mãos

E o pobre fica intrigado

Isso é uma certeza

Não é mentira nem boato

Lembre o que Flávio sofreu

Da boca de Honorato

Hoje estão juntinhos

Na mesma cama de gato

Por isso meu amigo

Vote como bom cidadão

Não se incomode em quem vai

Vencer a eleição

Porque entre políticos

Não existe distinção”.

Entre seus escritos encontrava-se temas variados, lindas orações e suplicas em verso, grandes declarações de amor e afeto aos amigos, aos parentes, à filha Josélia, do seu segundo casamento após a viuvez. Até enquanto produziu escreveu sobre tudo, acontecimentos importantes que envolviam o país, como a instituição do plano real e a Declaração dos Direitos da Criança, além de inúmeros textos que exaltam a importância da Educação e da Valorização dos Professores.

Dona Marina era figura popular, alegre e querida embora incompreendida por muitos por sua sinceridade e audácia no falar, além de muito dedicada a igreja católica e seus movimentos e pastorais.

Sua sensibilidade aguçada a fazia transformar tudo em verso e em paródias. Sua terra, sua gente e as figuras folclóricas “da vida comum”.

Como a poesia imensa, que porém capaz de arrancar risos do leitor do começo ao fim, quando escreveu em 1978 sobre a turma da cachaça que escreveu com o pseudônimo de Catabi, eis alguns versos:

“A 29 de Dezembro

Dia de São Clemente

Tendo eu viajado

Pedi a são Vicente

Para trazer uma mensagem

Pra turma da aguardente...

Pé de Bode e Manoel pau

Que gostam bem do pifão

A turma da Jurubeba

Que é Nino e João Bastião

Vão logo tirando a medida

Do palito de caixão...

Lá do Engenho Gracioso

Que tem uma turma lá

Quinca, Loba e Zé de ErmeP

Para a cana aqui cortar

E do alto da caixa d’água

Vou trazer Luiz de Oscar...

João Lopes também vive

Só pra fazer confusão

Com uma turma de político

Eu não sei se quero não

Vou trazer é Biu de Belo

Bodeiro e Zezé Pão...

Bia eu vou lhe buscar

Por que conheço bem

Sendo da turma do óleo,

Qualquer um me convém

Se você não pode vir

Mande que eu espero aqui

Toinho Campina ou Glauben...

A todos muitas lembranças

E um 79 feliz

Aceite de coração

O aviso que fiz

E um abraço apertado

Do amigo Cata Catabi”.

Dona Marina, após a aposentadoria, a segunda viuvez viveu com sua filha, seus amigos, seus versos e as atividades da igreja católica, até ser acometida de grave doença que a deixou sem andar. Seus versos demonstram o quanto sofreu nesse período, além de deixar atestado o abandono que muitos amigos a deixaram, o que a fez entre outras coisas, integrar-se à Igreja Batista.

Com sua fé inabalável aceitou sua doença, enfrentou-a e não mais agüentando uma grande coleção de textos maravilhosos que só nos fazem ver a riqueza dos filhos deste solo.

Escrito por: Kleber Henrique

Professor de História e Especialista em História do Nordeste

E-mail: prof_kleber_henrique@hotmail.com

Agradeço todo o material cedido por sua filha Jó (Josélia) por nos ajudar a levar o conhecimento público um pouco de sua mãe.

Um comentário:

Anônimo disse...

Obrigado Kleber,
por lembrar de Tia Maria,

Dido Borges