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Caros amigos sejam bem vindos ao Blog Cuca Livre Um Jeito Diferente de Pensar. Aqui você pode ler, refletir, através do senso crítico opinar e também expor suas idéias.

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quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Apresentação


A Direção


Chegamos enfim ao nosso número VI, e na verdade foi uma verdadeira maratona conseguir produzir essa edição.

Novembro começou corrido, mal tivemos como nos reunir, apenas cada um sabia o que iria escrever porque isso já estava definido de muito tempo. O jornal é uma cria da gente e adoramos faze-lo, porém cada um trabalha em outras coisas e em escolas evidentemente. Escolas em fim de ano é uma correria, notas, provas cadernetas, feira cultural e outras cossitas más. Então, por mais que a gente correu, não deu para sair em novembro, mas saiu.

Muitas vezes a gente lamenta e até briga um bocado com relação a essa questão do tempo, mas uma coisa é certa: o jornal não é um noticiário é uma publicação de reflexões, de idéias e por isso mesmo, sua temática sempre pode ser colocada em pauta ou em questão ou em discussão a qualquer momento.

Duas coisas relativas a essa edição que também explicam sua demora foi a dificuldade que tivemos para conseguir ir até Goiana e entrevistar o professor Mário Carmelo e a espera pelas atas das reuniões da Câmara Municipal que por não termos tido acesso, esse mês o jornal ficou faltando o Balanço Legislativo.

Esse número é todo dedicado a um eixo temático: A Consciência Negra. Isso já estava definido desde que o jornal surgiu. Nós da equipe, nos reconhecemos prazerosamente como afro-descendentes, como é o Brasil inteiro.

Então, o leitor encontrará todas as abordagens dessa edição plasmadas no que a Mãe África no legou.

Enfim, de tudo o grande prazer que é nos comunicarmos com vocês.

Boa leitura! Um abraço de todos que fazem o Cuca Livre

A Direção: Daniel, Carlos, Josias e Kleber.

Um Desenho

Pensar é Causar!

Negro sim, por que não?


A princesa Isabel foi muito feliz ao libertar os escravos em 13 de maio de 1888, libertou os escravos, porém, não assinou a carteira de trabalho do negro que ainda não obteve sua liberdade total. Sabemos que no país infelizmente nosso negro continua escravizado e sem nenhuma perspectiva de conseguir seu objetivo, ser tratado com dignidade como um verdadeiro ser humano, um verdadeiro cidadão, é vergonhoso um país tão rico como o nosso, mas ao mesmo tempo tão pobre de reconhecimento humano e até religioso, porque todos nós somos irmãos não é verdade? O Deus que criou o branco, criou o negro, qual a diferença? Onde está o valor maior entre a pele branca e a pele negra? Deus criou o homem à sua imagem e semelhança. Dando a cada um de nós um dom, uma missão, e nessa criação esta incluída o nosso negro, o cidadão de pele negra que traz no sangue sua gana, sua bravura e seu orgulho, o orgulho de ser negro. Foi ele que viveu nas senzalas, na roça trabalhando para os senhores brancos, mulheres negras serviram de damas das senhoras.

Nós devemos muito ao negro, por que esse preconceito? Esse racismo? Por que o negro é tão perseguido? Muitas vezes as pessoas são excluída só por terem sua pele negra, isso não pode acontecer num país que se diz livre, que liberdade é essa? Onde nos manos das grandes cidades um cidadão por ser negro é tratado como um bandido um marginal, o valor de um ser humano não está na cor de sua pele, e sim no seu caráter, na sua dignidade. Nossa sociedade esta totalmente conturbada, a onda da desigualdade social está evadindo nossos lares nossa família, o preconceito, a sede de poder, a falta de solidariedade o respeito pelas pessoas e seus direitos, tudo isso também é escravidão, vamos limpar nossas mente, vamos lembrar que somos todos iguais perante a resto da vida.

Racismo é crime, racismo é feio é um ato abominável de alguns que por terem sua pele branca acham-se o todo poderoso, o dono da razão o senhor de tudo, é engano cara; sabemos que dentro de qualquer sociedade desse país caminham os verdadeiros negros, aqueles que mesmo com suas peles brancas é bem tratada por onde passam deixando o rastro de destruição, de medo devido aos atos que praticam contra a um outro ser humano, repito o valor não está na cor da pele e sim nos valores, na ética e sobretudo no caráter, quantos brancos não nos envergonham? Quantos negros não nos orgulham?

A você que é negro, todo o meu respeito, meu amor, todo o meu apreço por tudo que tem feito pelo nosso país, pois foi o negro vindo da África como escravo que construiu esse meu país. Por isso viva o nosso negro e viva a liberdade, sou descendente de negro com muito orgulho tenho a pele branca mas meu coração e meu sangue negro coração esse que bate forte em busca da liberdade, liberdade de falar, escrever e pensar. Salve o nosso negro. Negro sim porque não?

Escrito por: Maria Araújo (Lia)

Poetiza e Cordelista

Umas Palavras

Mário Carmelo (Professor Mestrando em Ciências da Religião e babalorixá)

Data: 12/11/07

Local: Sindicato dos Servidores Municipais de Goiana.

Cuca Livre: O que é Candomblé? Conceitue:

Carmelo: O candomblé é uma religião que tem suas bases na mãe África, a África entendida como Continente e não como se fosse um elemento não diversificado. Na verdade, ela é um Continente, constituído de diversos países e nações e nem toda a África contém a religião candomblé, é bom que se diga isso, até por conta do avanço do Cristianismo e do Islamismo lá, mas ainda assim existe o culto aos orixás. Então, baseado nesse culto aos orixás, trazido pelos negros e pelas negras que vieram ao Brasil como escravos, eles trouxeram também os seus fundamentos religiosos e suas crenças. Aqui, na impossibilidade de poder praticar a sua religião, unificaram todos os cultos de orixá que na África eram regionais. Vamos tomar como exemplo: em Goiana digamos que se prestasse homenagem para o orixá Iemanjá, em São Vicente Férrer para Ogum, em Timbaúba para Omulú, então, na África era assim, eram cultos regionais e quando vieram para o Brasil, eles pegaram todos esses cultos particulares para orixá e unificaram, e a isso foi dado o nome de Candomblé. O candomblé na realidade significa “lugar de oração”.

Eu vou ter que fazer uma abordagem: para o povo Yorubá, conhecido aqui no Brasil como povo ou nação Nagô, que é um povo monoteísta, ao contrário do que dizem, o Deus nosso se chama Olodumare.

Olodumare corresponde imprecisamente ao deus Jeová dos cristãos, imprecisamente porque ele não é entendido com aquelas características que esse deus Jeová, ou seja, esse Deus que a gente chama de Deus têm. Olodumare, criou os orixás, que são energias da natureza, energias que atuam no mar, no rio, no vento, no raio. Então, são energias, forças da natureza e essas energias atuam aqui na terra. Então, havia o Orum, que imprecisamente a gente pode dizer que é o céu para nós, e o Aiê que é a terra. Em tempos imemoriais o mito Yorubá diz que: entre o Orum (céu) e o Aiê (terra), a linha que dividia era muito tênue e os humanos iam para o Orum, os orixás vinham para Aiê e tudo vivia naquela harmonia. Até que alguém entrou no Orum, no momento que não podia entrar e Orixalá que é o orixá maior, repreendeu, falou que não podia entrar, mas essa pessoa não quis escutar a admoestação e entrou para reivindicar alguma coisa. Então, Orixalá ficou raivoso com aquela atitude do humano e pegou o seu cajado, chamado de Opaxorô e o lançou no Aiê com tanta firmeza, que separou o Aiê do Orum, criando a atmosfera. Daí por diante, nós humanos, só podemos entrar no Orum através da morte e os orixás vem do Orum para o Aiê, através do candomblé por isso existe o Candomblé, por isso existe aquela festa. Candomblé é festa.

Candomblé não é aquele culto como na religião cristã: “minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa” ou a “renovação do sacrifício de Jesus na cruz”. A religião cristã baseia-se muito num Cristo ensangüentado, sofrido e todos tem culpa. No Candomblé não, não têm essa culpabilidade, esse peso, “você é um miserável, você têm que se converter porque se não vai pro inferno”. Não, não têm isso no Candomblé a visão negra é diferente, graças a Deus. Somos diferente nesse aspecto. Então, é naquela festa do candomblé que há um reencontro, dos orixás conosco humanos e mortais, porque houve um dia a separação.

No momento da festa, as pessoas entram em transe, “recebem aquele orixá, e é o encontro do transcendental com o humano e o orixá reconstrói o mito que foi criado em cima dele que na verdade é uma energia da natureza. Então, o Candomblé é isso, é alegria, é a celebração da natureza. Se eu digo que Iemanjá é o mar, se eu digo que Oxum é o rio, que Iansã é o vento, Xangô é o trovão e Oxossi é a mata, nós temos um compromisso muito sério com a preservação da natureza. E nós humanos também somos natureza, esse cuidado também se estende a nós, ao nosso corpo. Enquanto outras religiões proíbem usar preservativos, nós dizemos que têm que usar para evitar um problema maior. Então, o candomblé é uma celebração da natureza, é o reencontro dos orixás com os humanos e é muito bonito, e não é só porque é bonito, é porque o rito é o reviver do mito, e segunda. A Antropologia, toda religião tem isso, a reprodução do mito, do que nos foi dito no livro sagrado, e nós temos também o livro sagrado, não escrito, mas oral, passado de geração em geração.

Cuca Livre: Como se deu sua decisão de aderir ao Candomblé?

Carmelo: Eu inicialmente, nasci como a maioria dos brasileiros numa família católica, e me sentia muito bem no catolicismo, era praticante ferrenho. Eu lia a Bíblia, lia livros de interpretação da Bíblia, conversava com os sacerdotes católicos, com aqueles mais entendido, porque existem aqueles que são medíocres, né? E eu procurava saber, eu achava que era vocacionado, ou seja, que ia ser padre. Então, tive minhas decepções, não com a doutrina católica, mas com as pessoas. Eu era um adolescente, e via que os fieis não tinham aquele compromisso como os protestantes tinham e eu achava o protestantismo errado naquele momento. Mas, o compromisso dos protestantes, não com esse negócio de não fumar e não beber, não era isso. Era o compromisso mesmo com a religião que eu não via no catolicismo. Aí, vi que esse descompromisso não era só dos fieis, mas entre os próprios sacerdotes. Vi padre intrigado de padre, mas na missa diziam que ninguém podia ficar de mal com o outro. Então, o discurso não estava em sintonia com a prática, aí isso me chocou. Isso há em todo lugar, mas na época eu tinha 18 anos, hoje tenho 44, hoje tenho a maturidade que eu não tinha na época para entender essa complexidade. Não me arrependi porque eu fui católico, nem me arrependo onde estou hoje, felizmente não me arrependo de nada disso.

Eu achava bonito, eu tinha atração pela religião africana, sempre achei bonita, sempre quis saber, embora, não acreditasse em nada daquilo. Para mim tudo aquilo era auto-sugestão, mas até que um dia, eu encontrei alguém, aqui na cidade de Goiana, que hoje é falecida, mas a maioria aqui na cidade conheceu Mãe Sunça. E comecei perguntando como era, e ela começou a me responder e eu fui vendo que o que diziam que no senso comum, pois falava muito mal da Umbanda e o Candomblé, eu vi que não era nada daquilo. Mãe Sunça nunca me chamou, até porque a religião Afro-brasileira não é proselitista, não objetiva atrair adeptos através de discursos emocionados como fazem certas igrejas e religiões, e às vezes, nem está em consonância com as práticas, mas tudo bem, é o comercial que eles fazem e no Candomblé não tem isso.

Minha entrada foi essa, e estou até hoje e quero acreditar que só vou sair no dia que partir pra o Orum, para reencontrar com meu orixá Ogum (Risos) eu sou filho de Ogum com muito prazer.

Cuca Livre: Você já sofreu ou sofre preconceitos herdados do sistema patriarcal de colonização do Brasil?

Carmelo: É, quando me fazem essa pergunta eu tenho até vergonha de responder, porque se eu sofri discriminação étnica, eu não percebi. Aí as pessoas sempre acham que porque eu sou afro-descendente, eu devo dizer que já sofri. Se eu tivesse percebido eu diria, ou eu fui muito superior àquilo tudo e o meu consciente apagou, não sei, nunca percebi. Deve ter acontecido, eu não sou diferente dos outros, nem sou privilegiado, deve ter acontecido só que eu passei por cima disso tudo. É o que eu entendo, não sei se a minha resposta, se estou sendo honesto comigo mesmo, mas não me lembro. Agora, quanto à religião, há uma corrente do judaísmo que sacrifica animal, mas não tem problema nenhum porque são judeus, há certas religiões que entram em transe, mas não tem problema nenhum porque são outras religiões; mas quando se trata de Candomblé, que é de origem negra, que foi do escravo, sujo, ladrão, ignorante, tudo quanto não presta é vociferado. A nossa religião não perdeu esse estigma que foi imposto pela visão européia, eurocêntrica, patriarcal, não é? De molestar, macular os negros e as negras escravos. Então, tudo que vinha do negro era ruim, e o Candomblé com era a sua religião não ficou fora disso, ela também é vista dessa forma. Hoje, eu não preciso ficar batendo de porta em porta dizendo: “ – Minha gente, eu sou do candomblé!” não, não há necessidade disso, agora quando me perguntam eu digo: “- Eu sou!”. E às vezes eu nem digo, eu deixo que as pessoas descubram, porque as atitudes falam muito mais fortes do que as palavras. As palavras tem força pela sua importância, mas elas tem o seu momento. Então, as pessoas tem uma coisa: “- Você é católico?” eu digo: “- Sou não, mas eu não preciso dizer que sou do Candomblé, tudo isso depende do momento.

Cuca Livre: Uma concepção presente no senso comum, que é uma das mais altas expressões do preconceito com relação a religião, é a demonização das religiões afro-descendentes e a idéia do poder de maldade. Como você encara essa questão?

Carmelo: O que eu acho interessante é que quem mais fala no diabo e no inferno são os cristãos. Isso é o que o cristianismo diz é que Deus é onipotente, onipresente e onisciente, que está em todo lugar, vê tudo e num sei o quê... Mas, qualquer coisa que eles entendem por errada, o diabo também está lá presente. Então, o diabo também esta em pé de igualdade com Deus? Então o diabo também é onipotente, onipresente e onisciente? Essa é a pergunta que eu faço aos cristãos.

Agora veja bem, como é que falam das religiões de matriz africana? Como é que nós somos cultuadores do demônio se na nossa visão negra não existe diabo? Não existe inferno? Não existe conceito de bem e de mal? Nosso conceito é bem diferente! É um outro universo! O bem e o mal está presente no ser humano independente de religião e essa dicotomia que foi criada pelo Ocidente, possivelmente baseada nas teorias de Santo Agostinho. Foi Santo Agostinho, nos primeiros séculos do cristianismo e ele é considerado o pai do Ocidente, porque foi ele quem deu estrutura, ele quem deu linearidade ao tempo aqui pro Ocidente. Para nós, negros e para as outras culturas, o tempo é circular e não linear. Não é escatológico, não tem aquela idéia de começo meio e fim, e fim trágico com destruição de tudo. Nós não temos essa visão, escatológica, linear e soterológica. Os cristãos tem essa visão de salvação, nós não temos esse conceito de salvação e condenação. Essa dicotomia de bem e mal não se aplica, não se adequa na visão afro-religiosa. Não se aplica porque o cristianismo separou o bem do mal, Santo Agostinho sempre teve esse problema de explicar de onde veio o mal, porque eles dizem que é um só Deus, então esse diabo veio de onde?? E não tem explicação para isso. Isso é um problema que eles cultivam até hoje, dois mil e oito anos de igreja romana e eles ainda cultivam isso. Agora também, porque foi dado essa idéia do mal? – Porque quem não rezasse pela cartilha do catolicismo no período colonial era contra ele. Então, se não era de Deus, era do Diabo e pronto!

Cuca Livre: Teoricamente, as religiões tem uma ética. Qual a ética do Candomblé?

Carmelo: Eu gosto muito de dizer que quando falo disso que é um tema polêmico em que as pessoas não gostam de falar, mas eu falo, que é o sexo. Veja bem, em questão de sexo é outro problema do cristianismo, é um tabu desgraçado. E o sexo, de mal que eu saiba não tem nada. Nossa religião funciona mais ou menos com as outras religiões, mas a questão que eu vou tocar aqui é que por exemplo: na nossa crença, um homem gostar de outro homem, isso não quer dizer nada, não tem nada a ver com isso. Uma mulher gostar de outra mulher, gostar afetivamente, sexualmente, isso pra gente não constitui nenhum problema, até porque, essa questão de pecado, na nossa religião não existe, essa questão do pecado, da culpa, da cultura da culpa é dos cristãos.

Eu tinha um medo desgraçado de morrer quando eu era católico, por causa dessa história do inferno. Há! Deixei de ter medo? – não, o medo é até natural do ser humano, mas eu perdi muito. Porque quando eu morrer, eu sei que eu vou pra qualquer lugar, mas para o inferno eu não vou não, porque eu não acredito nisso. Eu acredito em Olodumare, que criou os orixás, quem criou o mundo não foi Olodumare como no cristianismo em que Deus criou o homem. Não, quem criou a gente foi o nosso próprio orixá. Quem criou o mundo foi Orixalá que é o orixá maior, a energia maior. Para o cristianismo e judaísmo, Deus criou o homem e o homem é semelhança de Deus, para nós não, nós somos a partícula do nosso orixá, eu não sou diferente dele, mas uma partícula dele, do orixá que me criou. Essa idéia no cristianismo chama-se Gnose. Então na nossa religião é assim. Às vezes me perguntam: “- por que no candomblé tem tanto homossexual?”. Eu respondo: -“tem em todo lugar, só que no candomblé o povo assume (risos)” as diferenças são essas, somente. (risos).

Cuca Livre: Como o Candomblé ver a morte?

Carmelo: A morte é aquela questão, nós vivemos no mundo ocidental judaico-cristão, aí fica complicado. Geralmente, você veio de um ramo ou de outro, do catolicismo ou do protestantismo, você vem com aquele conceito cristão, então, fica difícil de você arrancar de dentro de si essa questão. A morte, ela deveria ser encarada como um segmento, mas a gente a entende como um término. Qualquer coisa que termina, que acaba, não nos faz bem, até porque, nos internalizaram a idéia de eternidade. Se eu sou seu amigo, então eu sou seu amigo para sempre, eu vou na sua casa sempre, então quando eu deixo de ir, alguma coisa está errada e não é assim. O casamento tem que ser eterno, mas que conversa é essa? – É, até enquanto é possível. Nos internalizaram esses conceitos de eternidade e a gente vive com eles. Aí quando a gente se depara com a morte biológica, entendemos que tudo acabou ali, embora que eu entenda que exista outra vida.

Eu faço esse questionamento a mim e a todos os outros religiosos: se a gente, quando sair daqui, vai se encontrar com Deus, qual o problema? Vamos morrer agora? Porque ninguém quer (risos) isso até eu mesmo me questiono. (risos).

Cuca Livre: Você, além de babalorixá, é professor e pesquisador, na sua visão, qual o papel da escola em amainar esses preconceitos?

Carmelo: É, primeiro eu fui babalorixá, depois cursei na Faculdade de Formação de Professores de Goiana, tenho muito prazer em dizer isso, porque tem pessoas que tem vergonha de dizer. Eu estudei em Goiana e com muita satisfação, e amo minha cidade, assim como vocês devem amar a de vocês. Especializei-me em História do Brasil também na cidade de Goiana, foram bons cursos. Hoje, estou estudando o mestrado em Ciências da Religião na Universidade Católica de Pernambuco, e é um curso excelente. Eu estou ampliando horizontes, eu estou aprendendo mais e descobrindo o quanto eu era burro, agora to menos viu? (risos). O que acontece, a escola tem a função de educar e libertar, Paulo Freire diz né? Então, ela tem essa função, toda vez que eu vou a escola falar sobre o assunto da consciência negra, eu digo que muitas vezes a própria escola também é preconceituosa. Quando chega as festas juninas por exemplo, então, fazem aqueles cartazes, as bonecas e os bonecos são todos brancos, não tem um negro sequer. Por que na entrada dos banheiros, a figura de mulher e de homem, o cabelo é liso? Não pode ser negro não?

Por aí você já ver, são pessoas que não acordaram para isso, e não fazem por maldade, mas porque a ideologia é muito forte. O negro não protagoniza as novelas, ele é o empregado ou a empregada, ou é um malfeitor. Ele foi protagonista em Chica da Silva, até porque não tinha como ser branca, principalmente numa determinada rede de televisão que todos conhecem aqui no Brasil.

A escola tem esse papel. Agora foi bom você ter falado nisso, porque no governo Lula, apesar de muitas críticas, tem feito alguma coisa que é interessante pra gente, para a sociedade e sobretudo para o Nordeste.

Lá vai Goiana mais uma vez, Goiana sedia um Curso de Especialização de Pedagogia Afirmativa, ou seja, o Ensino da História da África pela perspectiva negra e não branca.Então Goiana foi a primeira do Brasil a ter um curso no nível da Especialização, formando professores para que na escola ele vá ensinar, ele aborde a História da África em História, em Literatura, em Arte.

Cuca Livre: Você acha que o Brasil está mais próximo de um ecumenismo religioso?

Carmelo: Hoje, o clima e talvez não só no Brasil, eu não posso afirmar lá fora, mas aqui no Brasil, o clima de hoje é aquele clima de ecumenismo, isto é, o respeito entre as religiões. O clima é de democracia, o clima é de pluralidade religiosa. Então, são esses conceitos filosóficos que pairam, que nós respiramos no momento e isso nos leva a crer que num futuro próximo, isso é paulatino, cada vez mais, vai havendo essas aproximações.

A Igreja Católica Romana, perseguiu demais o Candomblé, todo mundo sabe disso e quem fez História principalmente, você fez História e sabe disso. Mais hoje em dia, ela não tem mais condição de fazer e deixou de fazer, não porque seja boa não, é porque não tem mais condições. O contexto Histórico de hoje não permite mais isso, então, hoje existe padres, existem freiras, existem cristãos leigos que se aproximam do candomblé para entender, é uma maneira de dizer: Perdoe-me pelo que fizemos no passado. Mas, de certa forma estão reconhecendo.

A Universidade Católica mesmo, todo mês tem um encontro de diversos sistemas religiosos para se mostrar quem é quem, sem se agredir, para se mostrar, para se aproximar, para acabar com isso. Se entendemos que Deus é um só, então porque essa diversidade? Então, se ela há, vamos nos respeitar, vamos nos reconhecer, vamos acabar com isso!

Cuca Livre: Qual a visão do Mundo Ideal para o adepto do Candomblé e como é possível a construção desse mundo?

Carmelo: Eu vou falar por mim, mas não deixo de estar neste contexto. Minha visão de mundo seria o compromisso que a gente tem com Olodumare de preservar a natureza, pois se agente acabar com ela, acabou o orixá, acabou todo mundo. Então, a natureza que nos foi dada e que nós reverenciamos, através dos orixás, as pessoas não entendem. O candomblé é uma homenagem à natureza, não é a demônio nem a nada disso. A partir daí, a compreensão de que o outro, de que a alteridade do outro é ímpar. Então, vamos respeitar as diferenças, vamos acabar com as guerras, com os conflitos. Isso seria o ideal, mas não estou dizendo que vai acontecer.

Gostaria de um mundo sem tantas diferenças sociais, sem essa distância entre rico e pobre, daí gera também o preconceito. A estratificação social, quem é das Ciências Humanas sabe disso, que foi a partir daí que começou a existir as diferenças.

Bate Bola

Cuca Livre: O mundo?

Carmelo: Não está muito interessante, como também nunca esteve na minha visão, mas poderá mudar com a participação de cada um de nós.

Cuca Livre: As pessoas?

Carmelo: As pessoas são o mundo. Então, quando respondi o mundo eu pensei nas pessoas.

Cuca Livre: uma tristeza?

Carmelo: A minha é não ser poliglota.

Cuca Livre: Uma Alegria?

Carmelo: Eita! São tantas! Uma delas é ser da minha religião que não deixo por nada.

Cuca Livre: Uma possibilidade

Carmelo: Fazer Doutorado em Arqueologia.

Cuca Livre: Uma Palavra?

Carmelo: Amizade

Cuca Livre: Uma Frase?

Carmelo: Todo brasileiro, sem exceção tenha consciência de que só é através da educação que nos libertamos.

Cuca Livre: Um sonho?

Carmelo: Ver meus irmãos negros e negras, eu não quero só ver por esse lado. Eu quero ver meus irmãos despossuídos um dia ter alguma coisa em suas vidas, ter ao menos o básico, porque ainda tem muita gente que não tem.

Os Filhos Deste Solo

Não a conheci pessoalmente, mas somente a partir do que ouvia das lembranças dos meus velhos com relação a tudo que lembrava doçura, mãe Dedé tava presente. O leitor poderá assemelhá-la a tantas outras figuras presentes nas memórias de José Lins do Rego ou Gilberto Freire, mas tudo que busquei foi a partir do que ouvi.

Ainda muito pequeno, gostava muito de me sentar nos degraus da casa de mãezinha (Dona Maria das Mercês (poetisa)) e conversava com ela horas a fio. Uma história a cerca de mãe Dedé que nunca esqueci e que ouvi da voz mansa de mãezinha foi assim: – Meu filho, pena que você não conheceu, mãe Dedé era um anjo! Eu nunca vi ninguém tão boa, morava aqui de lado com madrinha Adélia e foi ela que salvou Gracinha da morte quando era pequena.

– E foi mãezinha?

– Foi Gracinha tinha crises de garganta horríveis e passava dias de cama, que uma vez ficou com as amídalas tão inchadas que não comia nada e eu via a hora ela morrer de tão magrinha. Fiz tudo e estava apavorada, até mãe Dedé vim aqui. Quando ela viu Gracinha naquela situação, a demora foi ela ir em casa, e ir a pé para a rua e voltar. Voltou com um pacote na mão, entrou no quarto, sentou na beira da cama e disse, desembrulhando o pacote.

– Oia aqui minha fia, mãe Dedé trouxe pra você uma boneca de cabelo. Os olhos da menina brilharam e ela continuou

– A boneca é sua, mas minha fia vai comer com mãe Dedé. Faça uma forçinha, pra poder ficar boa logo.

A menina diante aquele afeto e ao som de “Só falta mais uma” comeu tudo. E mãe Dedé saiu da casa dizendo a Maria:

– Ta vêno Maria que cum jeitin ela comeu. Se precisar minha fia todo dia eu venho.


Mãe Dedé: A mão do Amor


Josefa Maria da Conceição esse era o seu nome de batismo, mas o apelido foi o que vigorou. Não conheceu o pai e sua mãe fora escrava. Se dizia filha de ventre livre (Lei do Ventre Livre) dizia com orgulho: “Fui cativa não meu fio, sou de ventre livre, já era livre desde a barriga da minha mãe”. Sua mãe, tivera tido muitos filhos, de um bocado de pais diferentes como a mesma dizia. Isso era a condição das mulheres sob o signo da escravidão. Na impossibilidade de criar os próprios filhos, sua mãe doava os meninos para serem criados por quem pudesse e assim o fez com a Josefa.

Quando Josefa era pequena, já andava e falava poucas coisas, foi dada a Dona Ritinha e ao Sr. Gonçalo que eram um casal jovem, de boas condições e que não tinham filhos ainda.

Josefa foi crescendo, sob os cuidados de sua mãe Ritinha como ela chamava, até que dona Rita engravidou e teve uma filha que dera o nome de Adélia. Josefa ficou tão feliz quando a criança nasceu que insistia para pegar o bebê no colo e a mãe não deixava porque ainda era muito menina. Um dia, dona Ritinha ficou apavorada, o bebê tinha sumido do berço e ninguém sabia onde estava, procuraram por toda a casa, até que depois encontrou embaixo da cama, Josefa com o bebê no colo acalentando. Era tão pequena que cabia sentada embaixo de uma cama.

Cresceram as duas juntas, Adélia mais recatada e Josefa mais astuta, pregava peça nos colegas, coisas como ajudá-las a subir em árvores altas e não ajudar a descer, mas era queridíssima por todas, e por sua mãe Ritinha.

Adélia ficou moça, tornou-se professora, casou-se com Manoel Caetano e Josefa foi junto para cuidar da irmã e ajudá-la na casa nova.

Vieram os primeiros filhos e foi aí que Josefa virou Mãe Dedé, e seus dias daí pra frente foi cuidar de todos. Era catolicíssima, decorava as rezas todas, arrumava os altares da igreja e participava ativamente da Irmandade das Filhas de Maria, inclusive foi uma das pioneiras.

Mãe Dedé era quem zelava pela Igreja Matriz junto ao seu compadre Caetano. Era ela quem levava e engomava os panos da igreja e em casa, as bacias e o sabão eram separados também o “sagrado” do “profano”.

Mãe Dedé ajudou na construção e conclusão da Igreja Matriz, quando aos domingos subia para a missa levando uma pedra para a base. Presenciou as primeiras festas e procissões de fevereiro. Puxava os terços e as novenas na falta de padres, ajudava necessitados e não negava uma esmola a ninguém. Era adorada pelas crianças, principalmente quando estava fabricando as hóstias para alimentar a fé dos católicos.

Dia de fabricação de hóstias na casa do Sr. Caetano era uma farra, a meninada lá esperando os cacos e as que tostavam além do ponto e era mãe Dedé que coordenava a distribuição para não virar bagunça. Era tolerante, brincalhona e querida pelos mais jovens.

Ficou triste quando as meninas de seu compadre Caetano foram estudar em internato de freiras, achava ruim não ter todas por perto, mas se era pra estudar tudo estava certo. Mãe Dedé era alegre, ria das próprias coisas, dizia que não casou e nem queria porque só arrumava bêbados e não gostava muito de bebida, só nas festas é que tomava um pouco de cerveja e misturada com açúcar porque ela achava amarga.

Sua grande tristeza era não saber ler, ficava muitas vezes a olhar as revistas e jornais de seu compadre Caetano e era surpreendida quando alguém via:

- Oxente mãe Dedé! Ta de cabeça pra baixo!

E ela ria:

- Eu só to vêno as fotos.

A própria foto que encabeça essa coluna foi tirada em 1928 e mostra mãe Dedé bem moça com um livro nas mãos. Ela era questionada também por seus filhos de criação.

- Eita mãe Dedé e essa foto com um livro e tu não sabe ler!

- Ah! Minha fia e num foi o danado do fotografo do Recife que mandô.

Criados os filhos de dona Adélia, todos já encaminhados, trabalhando, mãe Dedé achou pouco e foi para o Recife criar os filhos de Dona Maria José.

Deixou todos criados e teve que voltar a São Vicente. Já estava cansada como bem colocou Maria das Mercês no poema intitulado Mãe Dedé:

“Aí foi diminuído sua macha

Desanimada de tudo arquiava

Pois seu corpo já não podia

E a tudo fraquejava”.

“Quando não mais podia

Caiu no seu leito de dor

Aí sofreu, gemeu

A espera da chamada do senhor”

Seus últimos dias foram em sua cama, ao lado de seus quadros de santo, todos os seus “filhos” ao redor dela, que decifraram em seus lábios cansados o ultimo desejo que foi realizado. A oração do Ofício de Nossa Senhora da Conceição.

“Cercada dos seus

Que lhes amavam com fervor

Com todos os sacramentos

Preparou-se para o Senhor”

No dia 08 de junho de 1976, os seus incertos 84 anos (não se sabe ao certo seu nascimento), mãe Dedé foi recebida no céu por um monte de anjinhos pretos e de mãozinhas doces como as suas.

Escrito por Kleber Henrique

Professor de História

E-mail: Prof_kleber_henrique@hotmail.com

Eu no Tempo!

Gabriel O Pensador - Racismo É Burrice (nova Versão De Lavagem Cerebral)

Gabriel O Pensador

  
Salve, meus irmãos africanos e lusitanos, do outro lado
do oceano
"O Atlântico é pequeno pra nos separar, porque o
sangue é mais forte que a água do mar"
Racismo, preconceito e discriminação em geral;
É uma burrice coletiva sem explicação
Afinal, que justificativa você me dá para um povo que
precisa de união
Mas demonstra claramente
Infelizmente
Preconceitos mil
De naturezas diferentes
Mostrando que essa gente
Essa gente do Brasil é muito burra
E não enxerga um palmo à sua frente
Porque se fosse inteligente esse povo já teria agido
de forma mais consciente
Eliminando da mente todo o preconceito
E não agindo com a burrice estampada no peito
A "elite" que devia dar um bom exemplo
É a primeira a demonstrar esse tipo de sentimento
Num complexo de superioridade infantil
Ou justificando um sistema de relação servil
E o povão vai como um bundão na onda do racismo e da
discriminação
Não tem a união e não vê a solução da questão
Que por incrível que pareça está em nossas mãos
Só precisamos de uma reformulação geral
Uma espécie de lavagem cerebral
 
Racismo é burrice
 
Não seja um imbecil
Não seja um ignorante
Não se importe com a origem ou a cor do seu
semelhante
O quê que importa se ele é nordestino e você não?
O quê que importa se ele é preto e você é branco
Aliás, branco no Brasil é difícil, porque no Brasil
somos todos mestiços
Se você discorda, então olhe para trás
Olhe a nossa história
Os nossos ancestrais
O Brasil colonial não era igual a Portugal
A raiz do meu país era multirracial
Tinha índio, branco, amarelo, preto
Nascemos da mistura, então por que o preconceito?
Barrigas cresceram
O tempo passou
Nasceram os brasileiros, cada um com a sua cor
Uns com a pele clara, outros mais escura
Mas todos viemos da mesma mistura
Então presta atenção nessa sua babaquice
Pois como eu já disse racismo é burrice
Dê a ignorância um ponto final:
Faça uma lavagem cerebral
 
Racismo é burrice
 
Negro e nordestino constroem seu chão
Trabalhador da construção civil conhecido como peão
No Brasil, o mesmo negro que constrói o seu
apartamento ou o que lava o chão de uma delegacia
É revistado e humilhado por um guarda nojento
Que ainda recebe o salário e o pão de cada dia graças
ao negro, ao nordestino e a todos nós
Pagamos homens que pensam que ser humilhado não dói
O preconceito é uma coisa sem sentido
Tire a burrice do peito e me dê ouvidos
Me responda se você discriminaria
O Juiz Lalau ou o PC Farias
Não, você não faria isso não
Você aprendeu que preto é ladrão
Muitos negros roubam, mas muitos são roubados
E cuidado com esse branco aí parado do seu lado
Porque se ele passa fome
Sabe como é:
Ele rouba e mata um homem
Seja você ou seja o Pelé
Você e o Pelé morreriam igual
Então que morra o preconceito e viva a união racial
Quero ver essa música você aprender e fazer
A lavagem cerebral
 
Racismo é burrice
 
O racismo é burrice mas o mais burro não é o racista
É o que pensa que o racismo não existe
O pior cego é o que não quer ver
E o racismo está dentro de você
Porque o racista na verdade é um tremendo babaca
Que assimila os preconceitos porque tem cabeça fraca
E desde sempre não pára pra pensar
Nos conceitos que a sociedade insiste em lhe ensinar
E de pai pra filho o racismo passa
Em forma de piadas que teriam bem mais graça
Se não fossem o retrato da nossa ignorância
Transmitindo a discriminação desde a infância
E o que as crianças aprendem brincando
É nada mais nada menos do que a estupidez se
propagando
Nenhum tipo de racismo - eu digo nenhum tipo de
racismo - se justifica
Ninguém explica
Precisamos da lavagem cerebral pra acabar com esse
lixo que é uma herança cultural
Todo mundo que é racista não sabe a razão
Então eu digo meu irmão
Seja do povão ou da "elite"
Não participe
Pois como eu já disse racismo é burrice
Como eu já disse racismo é burrice
 
Racismo é burrice
 
E se você é mais um burro, não me leve a mal
É hora de fazer uma lavagem cerebral
Mas isso é compromisso seu
Eu nem vou me meter
Quem vai lavar a sua mente não sou eu
É você.

Escolha da Música: Daniel Ferreira
E-mail:
prof_daniel.al@hotmail.com

Vento e Raiz

QUEM É O SECRETÁRIO DO DIABO?


Ave Maria! 18 horas. Os sinos dobram na Matriz chamando os cristãos de São Vicente para a contrição dos atos. Deus abençoando as suas criaturas nesta hora de paz e de recolhimento. O mel sendo cozido nos grandes tachos do Gracioso deixa na cidadezinha o adocicado cheiro da cana. Homens pardos trabalham nas fornalhas, na moenda, nos alambiques de Pedro Guedes. As mulheres descascam a mandioca que breve estará assada e fininha na mesa , engrossando o feijão ou na forma de bejus ou bolos. Frutos da terra e do trabalho do homem. Homens que foram criados à imagem e semelhança de Deus. Todos filhos do mesmo Criador. Todos?

Somos irmão em Cristo, pregava o padre, as catequistas, as professoras do grupo escolar, nossas mães e avós. Entretanto, como poderíamos ser irmãos de Secretário do Diabo, Besouro do Cão, Tapioca de Luto, Beiço de Porco, Balaio de Macumba, Bola Sete e de Amara do Alto da Igreja, tida como feiticeira.

Quando as crianças passavam da conta nas traquinadas, era comum se ouvir: Vou chamar o negro do cemitério velho pra te pegar! Menino que diz nome feio vai para o inferno cheio de negro do Engenho para jogá-lo dentro do tacho quente de mel! Secretário do Cão já passa por aqui...

Eram poucas as pessoas pretas em São Vicente Férrer. Havia muitos mestiços, pardos. Os mulatos ascendiam um tantinho na condição social e cristã, sendo considerados pretos de alma branca. Mas aqueles com mais característica subsaariana eram tidos como mensageiros do Mal: feiticeiros, discípulos de satanás, devoradores de criancinhas, portadores de maus presságios. Lá vem um negro ali... Deus me livre e guarde!!! Negro não presta! Negro só é bom com o lombo sangrando! O maior castigo do mundo é ver uma filha casada com negro! Negro no clube é para faltar luz! Veja que coisa mais feia... Aquilo é lá gente... Todas estas observações eram ditadas por senhoras e senhores católicos, brancos. Sou pobre, mas sou branco!!! Sou analfabeto, mas sou branco! Sou bêbado, mas sou branco! Sou ladrão, mas sou branco! Sou um criminoso, mas sou branco! Sou a gota serena, mas não sou preto!!!

Ser negro em São Vicente Férrer era o mesmo que ser um demônio, um ente do inferno lembrando aos da terra que o Diabo podia ser invisível, mas os seus secretários andavam pela rua! Contudo, cada cidadão vicentino dizia: Não sou racista!!! E ainda diz. Terá sido o medo de cometer um crime inafiançável perante a legislação penal brasileira? Ou será que nos altares de São Vicente Férrer há uma vaga para São Benedito - mesmo do tamanho de Santo Antônio? A forma mais eficiente de reforçar um preconceito é achar que ele não existe.

A minha geração cresceu ouvindo e vivenciando esta cruel e desumana realidade. Não lembro de nenhum colega de escola negro. E os que tinham mais características africanas à flor da pele jamais indagavam a si mesmos se eram pretos. Ser negro e assumir a negritude era sinal da aceitação irrevogável de que o Diabo o escolhera para as suas hostes. Dos lugares onde andei nunca presenciei semelhante racismo quanto a camuflada hostilidade vicentina. È de se perguntar por quê. Talvez porque o povo de São Vicente tivesse pavor da pobreza, da submissão, da exclusão social e também religiosa da nossa terra; o ranço do poder que somente é superior quando oprime, mente, calunia, apavora; o legado colonial, o sobejo da escravidão que atualmente assume outra face tão nociva quanto a anterior, ou seja, no desemprego, na prostituição, no alcoolismo, na falta de um porvir... Oferecendo uma vida de faz de conta, tão vazia quanto às vidas daqueles que acreditam ser superiores porque detêm o mando, o dinheiro, o pseudo conhecimento acadêmico, enfim uma pele com menos melanina e um cabelo escovado, mas que não pode sentir o pingo da chuva. Não é de se estranhar que vivamos atualmente com tanto medo, tanta violência, tanta dor.

Quaisquer formas de preconceitos são alicerçadas quando acreditamos, erroneamente, que a nossa verdade se sobrepõe ao do outro. Damos o nome de tolerância. Precisamos mudar esta nomenclatura já que pregamos tanto a comunhão. O Brasil é mestiço e isto faz de nós uma nação ímpar. São Vicente Férrer tem muitos brancos, mas isto não faz do nosso município um torrão justo, próspero e igualitário, muito pelo contrário, embora seja uma terra de solo fértil, rica em águas e verde, a maioria da população ainda vive como se ainda houvessem coronéis e feitores: sem lar, sem ar, sem terras, sem teto e sem razão. Pergunto: Como falar da nossa cristandade e cidadania se o futuro se mostra ainda com o furo de bala na pele do presente?

Lá vem o Secretário do Diabo, ele usa paletó preto, mas, cuidado, ele é branco!!!

Vou chamar dona Amara para amansar a minha vida de sobressaltos, ela decerto cantará assim: nesta rua, nesta rua tem um bosque que se chama que se chama solidão, dentro dele mora um anjo que roubou meu coração. E eu dormirei como uma criança e acordarei como homem. E os meus filhos e os filhos dos meus filhos herdarão a terra que tanto amo e que quero vê-la não feita de brancos, pretos, pardos ou amarelos, mas de homens de boa vontade. E quando os sinos dobrarem na AVE MARIA, eu terei muito mais a agradecer a Deus do que pedir.

Escrito por: Jorge Borges

Fonoaudiólogo, Teatrólogo e Poeta.

E-mail: j.gborges@hotmail.com

Vista de Um Ponto

CONSCIÊNCIA DE CORES...


Sabemos que a lei Nº. 10.639, de 9 de janeiro de 2003, incluiu o dia 20 de novembro no calendário escolar, data em que comemoramos o Dia Nacional da Consciência Negra. Lembremos que a mesma lei também tornou obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. Desta forma, com a implementação dessa lei, o governo brasileiro busca contribuir para o resgate das contribuições dos povos negros nas áreas social, econômica e política ao longo da história do país.

A escolha dessa data não ocorreu por acaso. Tudo nos faz lembrar a história: em 20 de novembro de 1695, Zumbi - líder do Quilombo dos Palmares - foi morto em uma emboscada na Serra Dois Irmãos, em Pernambuco, após liderar uma resistência que culminou com o início da destruição do quilombo dos Palmares.

Essa história, entre tantas outras que relatam as lutas pela libertação dos escravos, é muito mal contada nas escolas brasileiras. O passado do povo negro raramente é visto através da perspectiva de seus protagonistas. Num país cujo cotidiano é fortemente influenciado pela cultura africana, e onde 46% da população é de origem negra (segundo dados do IBGE), nada se ensina sobre a História da África. Em relação à abolição da escravidão, por exemplo, a historiografia oficial dos livros didáticos sustenta que a grande redentora dos negros foi princesa Isabel – herdeira da coroa de Dom Pedro II, Imperador do Brasil – ao assinar a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, declarando extinta a escravidão no Brasil.
David Santos, coordenador da Educafro, uma organização não-governamental voltada à educação de jovens descendentes de africanos, sustenta que a lei Áurea "não passa de uma farsa", pois, quando foi assinada, "só 5% do povo negro viviam sob regime de escravidão".

Historiadores contemporâneos mostram que a abolição da escravatura foi, na verdade, um processo longo, difícil, repleto de lutas e resistências, mas que, em determinado momento histórico, tornou-se inevitável – o nascimento do capitalismo liberal brasileiro, sob forte influência inglesa, via o sistema de produção escravocrata como um obstáculo ao seu pleno desenvolvimento.
A liberdade dos negros tampouco foi acompanhada de sua inclusão social. Os ex-escravos foram deixados à sua própria sorte em uma sociedade fundamentalmente racista. Muitos preferiram continuar a fazer os mesmos serviços a troco de comida, e até hoje os descendentes dos escravos são, em sua maioria, marginalizados, discriminados e excluídos das atividades sociais e culturais. A pesquisa "Mapa da População Negra no Mercado de Trabalho", realizada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (DIEESE) em 1998, mostrou "indicadores sistematicamente desfavoráveis aos trabalhadores negros". De acordo com esse estudo, por exemplo, em Salvador, estado da Bahia, os negros são 86,4% dos desempregados. No Distrito Federal, onde se localiza Brasília — a capital do país — a porcentagem chega a cerca de 68%. Mesmo assim, até hoje o 13 de maio — data da assinatura da lei Áurea — ainda é oficialmente comemorado como a dia da libertação dos escravos

Comemorar o Dia Nacional da Consciência Negra nessa data é uma forma de homenagear e manter viva em nossa memória essa figura histórica chamada ZUMBI. Não somente a imagem do líder, como também sua importância na luta pela libertação dos escravos, concretizada em 1888.

Embora seja incontestável ser a cultura européia a mais consolidada nas Ciências , nas Artes e na Filosofia, o estudante brasileiro precisa ter acesso qualificado à cultura africana para representar-se como cidadão brasileiro.

Devemos lembrar que não somos descendentes de escravos, mas de reis e rainhas da África. Aqui é que nos tornamos escravos. Essa história tem de ser contada, tem de estar nos livros dos nossos filhos, para termos orgulho de andar nas ruas, com a cabeça erguida, e de dizer que, quem construiu este País, foram os afro-descendentes. As outras etnias que vieram para cá receberam dinheiro. Nós recebemos chibatadas.

O secular preconceito ao negro como resultado da situação de inferioridade na relação de poder imposta pelo escravismo de história recente, faz com que todos, de qualquer etnia e classe social optem preferencialmente por identificarem-se com a cultura européia .

Os movimentos que tratam da defesa dos direitos das pessoas negras vêm contribuindo para o aumento da auto estima e conseqüente inclusão das mesmas no meio social .

A tendência etnocêntrica de considerar o negro como inferior indica a permanência do pensamento raciológico europeu dos séculos XVII e XIII que tem em Hegel um dos seus representantes por considerar o negro como o mais inferior de todos os tipos humanos , assim como , à época , as ciências biológicas consideravam as mulheres menos inteligentes do que os homens e a Criminologia, com Lombroso , admitiam que através do tipo físico podia-se reconhecer um criminoso . Quanto sofrimento foi evitado com o avançar da ciência , sobretudo nas sociedades e grupos humanos que têm acesso às informações e delas querem e podem usufruir. Lembremos que RAÇA não é uma verdade científica, mas uma construção da cultura de cada país.

Escrito por: Elias Monção

Professor Universitário de História

E-mail: eliasmoncao@bol.com.br

A Luta de cada Um!

Obs.: Onde se escreve Gantóis, pronuncia-se Gantuá

“Quero agradecer

Por tanto que nem sei

Quero oferecer

Tudo o que sei fazer

Quero dedicar tudo que em mim brilhar

A quem está no Gantois”. Caetano Veloso


Mãe Menininha do Gantois – Mãe e Yalorixá do Brasil



“Deus? O mesmo da igreja é o do candomblé. A África conhece o nosso Deus tanto quanto nós com o nome de Olorum.

A morada dele é lá em cima e a nossa cá em baixo”

Escolástica Maria da Conceição Nazaré, nasceu em Salvador – BA em 10 de fevereiro de 1894, negra e neta de escravos. Morava no terreiro (templo da religião do candomblé), fundado por sua bisavó Maria Júlia da Conceição Nazaré em 1849.

O terreiro localiza-se no subúrbio de Salvador e é conhecido popularmente pelo nome de Gantois, devido o terreno onde se localiza ter pertencido a um francês (belga?) Edwad Gantois que segundo muitos teria sido traficante de escravos e que teria trazido para a Bahia os ancestrais africanos de Escolástica Maria da Conceição Nazaré.

A menina cresceu em meio ao culto dedicado aos orixás, aprendeu os toques, os cânticos, as histórias, as comidas, lendas e cores dos deuses africanos com a avó. Ainda criança, fazia bonecos com palha de bananeira e sementes de plantas, eram os orixás, que nas mãos da menina vinham para a terra dançar.

Ainda muito nova, foi iniciada na religião por sua tia Pulquéria. A menina era filha de Oxum (Orixá feminina, deusa das águas doces, da maternidade da beleza e do amor).

Antes dos 30 anos, trabalhava como costureira numa fábrica de corpetes femininos na Salvador dos anos 20 e por vontade dos orixás, foi escolhida como a nova Yalorixá (sacerdotisa / mãe de santo) do terreiro. Foi surpresa para todos inclusive para ela, como afirmou mais tarde: “Quando os orixás me escolheram eu não recusei, mas balancei muito”.

Essa mocinha nova, com a vida toda pela frente teria que ter a responsabilidade tamanha de liderar um templo, cultuar os deuses, ser mãe de muitos, ouvir e aconselhar, zelar por tudo e ainda sofrer resistência de muitos adeptos do culto, principalmente dos mais antigos que acharam um absurdo a casa ficar nas mãos de uma menina tão nova, que ainda brincava de boneca. Foi esse evento que lhe deu o nome que ficou tão conhecido, Mãe Menininha do Gantois.

Durante a década de 30 existia a Lei de jogos e costumes, que durante a ditadura Vargas determinava que as festas e celebrações do candomblé deveriam ser realizados somente com a liberação da polícia e em horário estabelecidos pela delegacia. Essa lei tinha na verdade, o intuito de proibir a reunião de grupos para não tratarem de política.

Existe um fato interessante, certa feita estavam os devotos do candomblé realizando uma festa para orixás à noite, sem autorização policial e a policia foi fechar o culto. Mãe Meninha saiu à porta para falar com o policial que estava irredutível e queria acabar com a celebração. Ela com a sua doçura e humildade, disse: Doutor aqui tem nada demais não, a gente só está realizando um tradição ancestral. Entre doutor, venha dar uma olhadinha”. O delegado entrou e converteu-se ao candomblé.

Mãe Menininha casou-se com o advogado Álvaro McDowell (descendente de inglês) e teve duas filhas Carmem e Cleusa que mais tarde viriam substituí-la na liderança do terreiro.

Mãe Menininha não se negava em esclarecer a qualquer pessoa as questões ligadas à sua casa (O Gantois) sempre tinha pronto bolo de arroz, cuscuz e café quente para abrigar qualquer pessoa que precisasse. Dava consultas sem cobrar um tostão de quem necessitava de seu apoio.

Era católica praticante, mas aberta a outras religiões. A noite, não perdia as novelas, e a que mais gostava era “Selva de pedra”, depois tinha o rádio, que não perdia de ouvir programas evangélicos nem escutar música. Sua cantora preferida ema Maria Bethânia, que também é sua filha-de-santo.

Conseguiu acima de tudo respeito. Mais que superar preconceitos e afirmar o candomblé como símbolo da cultura negra, abriu a religião para outros seguidores, mais que ser católica, convenceu os bispos da Bahia a permitir a entrada nas igrejas das mulheres com os tradicionais vestidos do candomblé nas cores dos orixás.

Em 1976 o governador da Bahia Roberto Santos, liberou a casa de candomblé da obtenção da licença e do pagamento de taxas à delegacia de jogos e costumes a partir da sua influência.

Mãe Menininha entre todos os filhos que recebia e cuidava por igual, foi muito homenageada por artistas e intelectuais como Jorge Amado, Vinicius de Morais, Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outros.

Em 13 de agosto de 1986, morreu aos 92 anos, com mais de sessenta anos de dedicação, luta pelo fim do preconceito religioso, doçura e amor.

Mãe Menininha, lutou por liberdade, é a mãe do Brasil Mestiço.

Escrito Por: Kleber Henrique

Professor de História

E-mail: prof_kleber_henrique@hotmail.com

Liberducação

A escola é um local de preconceito?


Há um mês atrás, abracei a idéia de organizar na escola Coronel João Francisco uma homenagem ao dia da consciência negra. Preparei convites para os professores da escola (imagine ter que convidar os professores a participar de uma atividade que já está incluída no calendário da sua própria escola), para as escolas particulares e públicas da cidade.

Elaborei uma lista onde os professores deveriam colocar o seu nome, a turma e a atividade que seria apresentada no dia 20 de novembro. Tomei esse procedimento por conta de “três” FACÇÕES existentes na escola. A primeira FACÇÃO (FMMICAC – Faço, mas me importo com as críticas) concentra os professores que adoram se envolver nas atividades realizadas pela escola ou promover eventos e projetos que estimulam o aprendizado de seus alunos. Deixando as aulas rotineiras e cansativas e partem pra estratégias pedagógicas mais eficazes e significativas. No entanto, depois que terminam seus trabalhos passam grande parte do tempo satirizando as críticas recebidas, estimulando seu alunado e os amigos a pegarem carona na sua indignação.

A outra FACÇÃO (NFETRDQF – Não faço e tenho raiva de quem faz) Apenas critica. Faz questão de não se envolver em absolutamente nada que seja da escola. Diz que não participa porque não sabia, não foram convidados, e outras coisas do gênero. O fato é que este grupo que diz ter a experiência, o saber, possui uma hegemonia que os torna “os intocáveis”, suas vozes ecoam de forma totalitária nas decisões que evidenciam o crescimento da escola, e rotulam de maneira pejorativa os colegas de trabalho que se comprometem com uma prática diferenciada.

A outra FACÇÃO a (DEA – Deixa eu aparecer) ela é bem novinha, acho que ainda está esperando a papa esfriar ou uma oportunidade para colocar as unhas de fora e gosta de centralizar as atividades em quem as promove. Não buscam envolver os colegas de trabalho, sequer os convidam para prestigiar os trabalhos que geralmente são produzidos pelos alunos. Esses tipos de eventos apenas promovem o organizador e a escola recebe um mérito de vidro barato, e os alunos que deveriam ser alvo desses trabalhos ficam sujeitos a posição de figurantes.

Evidentemente, todas essas FACÇÕES que acabei de mencionar, são frutos de ações puramente humanas construídas em um tempo e espaço. Contudo, ser construído em um tempo e lugar não significa estar necessariamente preso a ele. Assim, aperfeiçoar os métodos de ensino e o próprio jeito de se relacionar com os colegas de trabalho são questões essencialmente de escolhas. E isso, contribuirá com o crescimento da empresa (escola), tornando a sala de aula um ambiente mais prazeroso, com vínculos afetivos entre o educador e o educando que permitem estimular o interesse dos alunos pelos conteúdos à serem abordados pelo professor.

Tentei descentralizar a consciência negra esse ano, talvez, seja muita pretensão de minha parte, mas, acredito que dei os primeiros passos nessa direção. Passei algumas noites sem dormir pensando na lentidão em que as coisas se programavam; fiquei extremamente angustiado quando dias antes das apresentações pude ver que a maioria das turmas não haviam nem escutado sobre as homenagens e palestras no dia da consciência negra.

A escola Coronel João Francisco tem permitido a realização de eventos extremamente importantes para a formação de alunos críticos-reflexivos, como é o caso do dia da consciência negra. Cabe apenas aos seus educadores saber aproveitar essa abertura e realizar mais eventos dessa natureza.

Desde que foi decidido vivenciar o dia da consciência negra que se traziam palestrantes de outras cidades, sempre na intenção de compartilhar conhecimentos a cerca do racismo, sistema escravista, danças de origem africanas, comidas, religiosidade, etc., porém, neste ano de 2007 os palestrantes foram os alunos do curso Normal Médio da própria escola Coronel João Francisco, foram eles: Flávio e Andreza do I NM com a temática “moda e beleza negra”, Ivânio do II NM discutindo “se há discriminação por parte da polícia em relação ao negro”, Elizabete e Rubenise do III NM abordando o “mercado de trabalho para o negro” e Allan do IV NM esclarecendo sobre o “sistema de cotas para negros”.

O professor de História Kleber Henrique um dos pioneiros deste evento também esteve presente expondo o tema “etnia e religiosidade afro-descendente”. Este abordou o tema de forma bastante cuidadosa, sem ferir a preferência religiosa de qualquer indivíduo presente, utilizou uma linguagem acessível aos alunos das diversas séries, semeando palavras de entendimento sobre as diferenças étnicas e religiosas.

Uma boa parte dos professores da escola também se envolveu nas apresentações juntamente com os seus alunos. Esse grupo de professores que chamo de (RAP – repensando a prática), sua participação foi de fundamental importância para a realização da consciência negra.

Fiquei muito feliz em poder ver os alunos palestrando, se posicionando diante de toda a escola. Acredito que essa prática em um dia como esse estimula não só a compreensão por parte dos alunos a cerca da diversidade étnica e as formas particulares de cada grupo humano entrar em contato com o seu deus, mas contribui de forma intensa no surgimento de palestrantes em um futuro não muito distante em nossa escola e comunidade. Lembrando que dessa maneira o aluno passa a ser o centro das atenções e há maior aprendizado, uma vez que, estes, precisam fazer pesquisas em várias fontes, estudar, preparar roteiro de apresentação, etc.

Não posicionar-se contrário ou não participar de qualquer atividade contra o racismo e sobre qualquer forma de preconceito preserva o indivíduo na condição de imparcialidade. Que em grande parte dos casos transporta uma essência “pacifica”, “isto não me interessa”, “não sou da área”, mas, que no fundo manifestam um posicionamento, a inércia. E, essa inércia produz cidadãos que não se manifestam a favor de seus direitos, de uma sociedade menos ignorante, corrupta, faminta, doente, marginalizada pela concentração de riquezas.

Assim, o aluno deixa de ser um espelho da prática do professor-inércia e assume a chefia de imagem original. O aluno exemplifica com ações mais significantes, fiscaliza o perfil do educador, grita por atenção e aula e espera pelos corredores e arredores da escola que o professor se metamorfoseie na prática escola, na avaliação, no discurso e nas idéias.

Porém, essa invenção de ser “imagem original” por parte dos alunos é um processo que tem proporcionado a perda de status do professor dentro do seu próprio ambiente de trabalho. Os alunos com esse perfil não manifestam interesse nas aulas destes professores, não os escutam, não os respeitam e o que é pior odeiam as suas disciplinas e o próprio professor. Aprendem a fingir que gostam do professor, assim como muitos professores-inércia fingem que gostam dos seus alunos.

A minha preocupação neste exato momento é sobre os rumos que isso pode tomar se não refletirmos seriamente sobre qual CARA que São Vicente Férrer deve ter.

O que você acha meu leitor? A escola é um local de preconceitos ou de combate ao mesmo? Você acredita que São Vicente Férrer possui uma cara legal? E quanto aos alunos que possuem uma imagem original, eles estão no rumo certo? As facções citadas no inicio dessa conversa elas são frutos apenas da escola Coronel João Francisco? Na sua empresa (escola) ou no local onde você trabalha existem facções?


Escrito por: Daniel Ferreira

Professor e Especialista em História do Nordeste

E-mail: prof_daniel.al@hotmail.com