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sábado, 28 de julho de 2007

A Luta de Cada Um

Anayde Beiriz – O Pivô da Revolução de 30

“Muitas atitudes minhas, incompreensíveis aos olhos desses fariseus por aí, vinham do angustioso recalque dos ímpetos de minha alma e da obrigação em que estavam, de dizer pela metade aquilo que eu poderia dizer totalmente”.

Anayde Beiriz nasceu em 1905 em Parayba* do Norte. Não era filha de nenhuma figura influente, apenas de um tipógrafo e de uma dona de casa, no entanto essa menina qualquer virou uma moça que com muito esforço dos pais fez o curso de normalista e aos 17 anos diplomou-se pela Escola Normal da Parayba. Naqueles primeiros anos da década de 1920, ser professora era a única profissão permitida às moças doutrinadas e treinadas ao silêncio, ao recato e à submissão.
Anayde certamente não estaria nessas páginas se ainda quando cursava o normal não tivesse transgredido e rompido com essas regras sociais. A pequena Parayba do Norte, capital do estado, era cidade provinciana, tacanha, preconceituosa e dominada pela política corrupta dos coronéis da República Velha e não combinavam com uma moça que embora sendo aluna laureada de sua turma, foi rejeitada como professora na Escola em que tinha estudado.
Já era de se esperar que ela não seria aceita, pois escandalizava a sociedade retrógrada da época, andava sozinha na rua, chocou a cidade com seus cabelos curtíssimos (a la garçonne), usava pintura, fumava, não queria casar nem ter filhos, andava em saraus recitando e fazendo versos junto aos poetas de seu tempo. Poetisa e escritora dos jornais, lutava pela inserção das mulheres na política. Além de sensual e libertaria era publicamente a favor da autonomia feminina. Essa mulher que pensava por si, não podia ensinar aos filhos da elite atrasada da Parayba, e mais uma vez, chocou a todos indo ensinar à noite, numa colônia de pescadores na Praia de Cabedelo.
O Brasil nessa época fervilhava com a política, o voto-de-cabresto e a violência imposta aos eleitores pelos coronéis donos de terra, o que garantia a vitória dos candidatos à Presidência da República. De 1889 até 1930, só venciam as eleições presidenciais os candidatos de São Paulo pelo Partido Republicano paulista “PRP” ou os candidatos de Minas Gerais pelo “PRM”, (Partido Republicano Mineiro) era o pacto do café-com-leite. Os coronéis se articulavam para com toda sorte de fraudes garantir essas vitórias e ganhar as benesses do Governo Federal após as eleições.
Nas eleições de março de 1930, surge uma nova força política no país, A Aliança Liberal, partido que lançou chapa para concorrer às eleições tendo como presidente Getúlio Vargas (gaúcho) e João Pessoa (o então governador da Parayba) como vice e mesmo sabendo que não venceriam a máquina da corrupção, a Aliança Liberal lançou a chapa e como esperavam, perderam as eleições para o paulista Julio Prestes que estava apoiado pelo pacto café-com-leite, pelas oligarquias estaduais e pelos coronéis do interior.
A Parayba fervia nesse contexto e a professorinha com suas roupas encarnadas, seu andar rebolado e suas idéias avançadas também fervia de paixão no caso de amor livre que vivia com João Dantas (Dantinhas) deputado e advogado, filho da elite dos coronéis paraibanos e adversário de João Pessoa. Embora fossem contrários nas idéias políticas, ele muito tradicionalista, ela muito avançada, a relação entre os dois se mantinha forte tornando-se alvo das fofocas, porém ambos não davam ouvidos e se encontravam no sobrado de Dantinhas, sem temer os olhares.
Perdido nas eleições, João Pessoa buscava provas que comprovassem a fraude que houvera nas urnas causando a derrota da sua chapa e mandou invadir o sobrado de João Dantas. Não encontrando as tais provas, os investigadores se apoderaram das cartas, poemas, diários e fotos eróticas de Dantinhas com Anayde num golpe baixo à privacidade do casal e tentando pegar carona no choque moral que a sociedade imbecilizada tomaria, expõem esse material numa delegacia da capital paraibana.
Sabendo do acontecido, João Dantas com seus brios feridos, procura o Governador João Pessoa e “lava sua honra e de sua companheira” dando três tiros publicamente no Governador João Pessoa que estava na confeitaria Glória (Rua Nova-Recife/PE) no dia 26 de julho de 1930.
João Pessoa morto dramaticamente era tudo o que A Aliança Liberal esperava para apoiado pela convulsão nacional articularem o golpe de tomar a presidência do país e empossar Getúlio Vargas, no acontecimento que se costumou chamar Revolução de 30.
João Dantas foi preso na casa de detenção do Recife e dias depois foi dado como morto por suicídio, o que os historiadores contestam até hoje. Anayde, estigmatizada como a quenga do assassino de João Pessoa, foi expulsa da Parayba, presa em Recife, aos vinte e cinco anos de idade. Não suportando a dor de viver uma época que não acompanhava sua visão, matou-se ingerindo veneno, e foi enterrada como indigente no Cemitério de Santo Amaro (Recife PE), embora sua memória tenha sido renegada durante anos pelos paraibanos e pela própria História do Brasil, hoje é motivo de orgulho para a evolução feminista no país.
Anayde Beiriz vive na História e em cada mulher que faz dos seus pensamentos seu guia, vive contra a maré dos acontecimentos de sua época, mas a favor de sua consciência, assinando sua breve e significativa passagem pelo mundo como uma verdadeira PARAYBA MULHER MACHO.

Escrito por: Kleber Henrique
Professor de História
E-mail: prof_kleber_henrique@hotmail.com

*A palavra Paraíba encontra-se escrita no texto com ‘Y’ porque era escrita dessa forma na época e a capital do estado (PB) chamava-se Parayba do Norte, passando a ser chamada de João Pessoa após esses acontecimentos acima relatados.

Um comentário:

Anônimo disse...

mais uma vez é um grande prazer comentar sobre esse trabalho estimulador a cada leitura,cada detalhi e critica que eu vejo aqui exposto... me enchi de imensa esperança ao ver a libertade de expressao sendo usada de forma encantadora...e que apoiar trabalhos como esse é so uma forma de ser realmente livre em mts termos... a cultura esta sendo mostrada de forma admiradora! leitora e fa... Rafaella moura!