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sábado, 28 de julho de 2007

Umas Palavras

Jorge G. Borges (Fonoaudiólogo)
Data: 10/07/07
Local: Sua Residência (Recife)

Cuca livre - Como você se sente em ser filho de São Vicente e atualmente viver fora dela?
Jorge Borges - Tenho saudades de São Vicente Férrer. A nossa cidade natal é uma extensão do nosso lar. Funciona como se todos fôssemos uma grande família.
Para mim é motivo de festa quando encontro algum conterrâneo. Infelizmente as oportunidades de vida são escassas e provocam o êxodo. Gostaria de viver em São Vicente e de alguma forma trabalhar pela minha terra, sensibilizar as autoridades da necessidade de preservação de nossas matas, das nossas fontes. São Vicente, apesar de fazer parte do Agreste Setentrional, tem características físicas da zona da Mata, aspecto que vem perdendo a cada ano. Haja vista os calores intensos, típicos da caatinga, os montes cobertos do verde monótono das bananeiras e cana, o assoreamento do açude do Cruzeiro, a fonte de Alimeira que não mais existe, o fio de água do Melo e dezenas de nascentes que desapareceram. Afora, tudo isto a tremenda desigualdade social, a falta de trabalho para a maioria da população, o álcool, a prostituição, a mendicância e outras mazelas sociais.
Cuca livre - Você é uma pessoa que desenvolveu habilidades ligadas à sensibilidade humana, escreve textos, contos e poemas. A que ou a quem você atribui o desenvolvimento dessa sensibilidade?
Jorge Borges - A São Vicente Férrer e ao seu povo. Tive o privilégio de ouvir estórias de Trancoso, cantadores de viola da Rádio Limoeiro, poemas de amor recitados pelo professor Zarthur, literatura de cordel cantadas pelo meu tio Julio Galdino, contos de fadas fantásticos narrados pelas vozes mansas de Tia Nana e Vó Liquinha, histórias bíblicas no salão paroquial com a descrição comovente de fé e cristandade na voz angelical de Dona Naninha; ouvi também os embaladores de coco no meio de feira, como Pedro Ernesto e Zé Preto do Azevém que se esgoelavam chamando as suas ninfas, entre tantos; maravilhei-me com a oratória de dona Beatriz dos Correios, a poesia de Maria de Pio e Marina Borges de Farias e as crônicas de Dr Aluísio. Participei dos grêmios escolares, li os romances de amor da literatura mundial emprestados por dona Eutícia e pela minha querida e estimada professora Dona Conceição Luna. Emocionei-me com o Conde de Monte Cristo, Tristão e Isolda, Romeu e Julieta, Menino de Engenho e Olhai os Lírios do Campo. Ainda guardo trechos da Bíblia de cor. Enfim a minha infância e adolescência em São Vicente foram marcadas por aventuras na minha querida terra e nas terras fantásticas do mundo escrito. Seria ingratidão minha não destacar as influências dos Circos, que costumavam passar o ano inteiro em São Vicente e que representavam a liberdade, a vida nômade; o cinema de Antônio Neves e os forrós de Mestre Avelino e Mané de Teté; as brigas de Nana no Engenho Gracioso, a cachaça de Petronila-Pé-de-Bombo, o coelho de Julia que tirava retrato até do padre. Como não despertar sensibilidades convivendo com tanta gente boa cujas vidas dariam um romance épico? Gente que me ensinaram a sorrir como criança e a chorar com adulto. São Vicente Férrer é minha musa e sempre será.
Cuca livre - Conte para nós sua experiência com o teatro?
Jorge Borges - O teatro é a possibilidade de vivenciarmos todas as nossas fantasias; viver em qualquer tempo ou cultura; denunciar injustiças sociais, religiosas e políticas; transformar a literatura e a música em expressões vivas. É o pai de todas as outras expressões artísticas, o mais antigo e por isso a mais louvável. Do teatro nasceu à sociedade: o homem primitivo de certo ao dançar ao redor de uma fogueira olhou o céu, imitou a natureza, criou os seus deuses, organizou os seus grupos, construiu ferramentas, pintou nas paredes de cavernas as suas sagas; fez dos ruídos guturais a fala, a musica, a linguagem. O teatro possibilitou o surgimento das civilizações. E tudo isso nos encanta. É, portanto a historia do teatro que me fascina e me influência o ser no mundo. Gosto de escrever textos que possam ser representados. Isso se deve também a São Vicente Férrer. Acreditava que escrevendo histórias que pudessem ser representadas todo mundo teria acesso a elas, alfabetizados ou não. E o teatro é vivo, logo, convence e comove ao vivo. Meu primeiro texto para o teatro foi A Flor e a Fonte, de Vicente de Carvalho, para o Grêmio do Grupo escola Coronel João Francisco, chamavam drama. Hoje teremos Drama no Colégio. E o texto era mesmo um drama: uma flor havia sido arrancada do ramo e caíra no rio. Ela o implorava, branca de terror, que não a levasse para o mar... e a fonte, sonora e fria com um sussurro zombador por sobre a areia corria, corria levando a flor. Certa feita, no Dia das Mães, teatralizei O Pródigo. Mamãe nos incentivou muito a declamar poemas. Pois para ela, o poema bem declamado criava emoções nos ouvintes. Foi um chororô naquele dia. Era uma tragédia: um homem deixara sua pobre e velha mãe desamparada e fora viver com uma gostosona que o seduzira. Depois, tempos depois, com a testa enfeitada, regressa ao lar e encontra a pobre mãe adormecida na cadeira de balanço... Sabe como é mãe perdão, choros e acalantos... Dona Angelita Pereira com soluços, dona Nininha do Melo com os olhos em córrego... Gosto mais das tragédias do que das comédias. Muito embora escrevo comédias com mais freqüência. Talvez porque já vivemos uma tragédia real. Escrevi vários textos, mas nunca acho que estao terminados. O texto de teatro também é dinâmico. O autor sempre acrescenta ou retira alguma coisa. Somos meio perfeccionistas. Como ator participei de poucas peças. Gosto mais de escrevê-las, assistir e ler peças de teatro. Participei de três grupos: O Liberart, Chão de Vidro e Tucap. Falar de teatro é muito falar...
Cuca livre - Conversando conosco, você lamentou não ter podido estar presente no evento de lançamento do Cuca Livre que tivemos a grande alegria de termos trazido o primeiro espetáculo de teatro profissional para a cidade. Conversando outro dia com um dos atores (Radamés Moura) da peça que trouxemos (A Farsa do Poder) sobre as repercussões da mesma na cidade. Ele fez a seguinte declaração: "o teatro em São Vicente cumpriu com seu papel que é divertir e principalmente despertar a reflexão e provocar o debate". Quais suas expectativas com relação ao desenvolvimento da arte no geral em nossa cidade?
Jorge Borges - São Vicente Férrer tem grandes artistas. Infelizmente sabemos que para quaisquer eventos há necessidade de verbas e patrocínios. Temos áreas favoráveis a qualquer manifestação artística: dança, música, pinturas, teatro, feira literária, recitais, etc. Acredito que faltam o envolvimento e a receptividade da população, entretanto sem a participação dos órgãos públicos fica muito difícil a concretização das artes. Não é necessário um prédio típico para o teatro, outro para danças. São Vicente tem uma acústica fabulosa e prédios públicos para a realização de eventos. É necessária a boa vontade dos administradores em comunhão com a participação popular. Com a democracia em ação em São Vicente Férrer, ela pode destacar-se na cultura Pernambucana posto que em cada cidadão há um artista.
Cuca livre - Durante muitas épocas em nosso país presenciamos a censura às artes de forma institucional e diga-se que esse mecanismo era usado principalmente nos períodos de ditatoriais. Hoje, vivemos o período pós-ditadura militar, a censura institucional acabou, embora ela revive de outras formas. Sabendo que você não é a favor da censura, mas você concorda que deva haver alguma restrição ou moderação à manifestação artística?
Jorge Borges - Sou contra qualquer forma de censura. A expressão artística é livre e é direito constitucional brasileiro, entretanto a liberdade artística deve cumprir suas finalidades, ou seja, divertir, encantar, educar e transformar ações que construam uma convivência social justa e harmônica. O teatro, em particular, tem a obrigação de cumprir a sua finalidade social, divertindo e denunciando os abusos dos diversos poderes que regem uma sociedade. E isto incomoda muitos prepotentes políticos, religiosos e falsos moralistas porque suas máscaras caem quando o homem popular e oprimido reflete sua condição de miséria, descaso e humilhação. Situações tão comuns nos municípios do Brasil.
Cuca livre - Você como teatrólogo e vicentino gostaria de poder assistir a montagem de uma de suas peças aqui? Qual?
Jorge Borges - Não me considero um teatrólogo. Sou um contador de histórias e de causos e que gosta de teatro. Ficaria muito feliz em ter uma peça encenada em São Vicente Férrer. Acredito que a Procissão do Outro Mundo (uma comédia sobre a avareza, dinheiro fácil e abuso de poder) agradaria a muita gente; O Anjo do Juízo Final no Brejo de São Vicente (a historia do padroeiro revivida na nossa terra) possibilitaria o conhecimento da personalidade do santo venerado por nossa gente; Como Amanso minha Sogra? A Morte Não Toca Viola...
Cuca livre - O que mais lhe alegra e o que mais lhe entristece aqui em SVF?
Jorge Borges - Motivos de alegria: rever e abraçar minha família e toda gente que conheço, tomar banho de açude, ver a lua cheia do Alto do Cruzeiro, acompanhar a procissão do Senhor Morto e do Rosário; visitar a Mata do Estado, caminhar no sereno pelas ruas da cidade, dançar um forró na Chã dos Esquecidos, recitar um poema de paz na Igreja e gastar 5 horas da João de Araújo até a Cel Henrique conversando com o povo. Motivos de tristeza: O desemprego, a destruição das matas, o apadrinhamento político, a prostituição e o álcool, a falta de esperanças estampada no olhar e nas ações de muita gente.
Cuca livre - Apresente suas expectativas com relação a nossa cidade:
Jorge Borges - Eu queria ver um dia São Vicente Sem ninguém esmolando pela feira A justiça abraçando a terra inteira E banida para sempre a opressão O respeito, a primeira obrigação Um verão menos quente, Um bom inverno O político corrupto no inferno O lugar merecido pra ladrão.
Tenho esperanças de que um dia São Vicente seja mais feliz. Basta que cada um assuma o compromisso com o bem estar de todos. É quase uma utopia. Mas é uma possibilidade e depende de mim, de você e de cada um de nós. Do contrário, que terra os nossos filhos herdarão de nós? E os filhos dos nossos filhos?
Cuca livre - Antes do nosso bate bola em nossa ultima pergunta, queremos que você usando sua poesia faça uns versos para o cuca livre e seus leitores.
Jorge Borges - (Pausa)
Pra cantar de Cuca Livre a liberdade É fazer da Esperança uma ação É do mundo inteiro ser irmão Hastear a bandeira da Igualdade É pregar o amor, a caridade Cultivar a amizade mais sincera Não fazer do tempo uma espera Das palavras de Cristo ser exemplo Coração de Deus, verdade e templo Pois o bem quando omisso, o mal prospera!!! Viva a Liberdade de Pensamento e de Expressão
Bate-bola
Cuca livre: O mundo?
Jorge Borges: Terra de todos e para todos.
Cuca livre: as pessoas?
Jorge Borges: Devem ter boa vontade.
Cuca livre: uma tristeza?
Jorge Borges: O desemprego.
Cuca livre: uma possibilidade?
Jorge Borges: Justiça para todos
Cuca livre: um gesto?
Jorge Borges: um abraço
Cuca livre: uma palavra?
Jorge Borges: Perdão
Cuca livre: uma frase?
Jorge Borges: Quem não sabe aonde quer ir, qualquer caminho serve.
Cuca livre: um sonho?
Jorge Borges: São Vicente sabendo a onde quer ir...

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